“Vivia em uma mata junto ao rio Molan um Leão idoso e sábio que, como
líder dos animais que habitavam a terra,
era grandemente respeitado entre todos. Devido aos longos anos de
experiência em liderança, desenvolveu uma
personalidade paciente, meticulosa, vagarosa, quase beirando a
contemplação. Entretanto, era por demais ouvido
entre todos quando se levantava pensativamente de sua moita favorita
usualmente dizendo: ‘Creio que sei o que
deve ser feito!’ Até seus rivais que o criticavam pelo seu jeito
pacificador de ser, enxergavam nele uma
fonte de sensatez.
Havia apenas um pequeno e quase imperceptível defeito em sua personalidade o qual, por tão pequeno, não era por ninguém visto como erro, mas sim como uma excentricidade, ou ‘até uma virtude’ - diziam muitos: o Leão odiava sujeira! Lama, restos de comida ou uma simples poeira o deixavam irritado e descontente. Não chegava a ser, entretanto, suficiente para nenhuma discórdia ou discussão. No máximo um desabono como um balançar de cabeça ou um ligeiro suspiro de indignação.
Havia apenas um pequeno e quase imperceptível defeito em sua personalidade o qual, por tão pequeno, não era por ninguém visto como erro, mas sim como uma excentricidade, ou ‘até uma virtude’ - diziam muitos: o Leão odiava sujeira! Lama, restos de comida ou uma simples poeira o deixavam irritado e descontente. Não chegava a ser, entretanto, suficiente para nenhuma discórdia ou discussão. No máximo um desabono como um balançar de cabeça ou um ligeiro suspiro de indignação.
Descendo o rio, no topo de uma árvore pouco frondosa, morava o Leopardo.
Ele era esguio e vivaz. Alegre, contador de piadas e particularmente gostava de
narrar engraçadas histórias sobre os habitantes do rio. Sendo o único animal de
grande porte naquela parte da floresta era chamado em qualquer emergência e,
mesmo sem a ponderação e experiência do leão, promovia soluções fazendo piadas
dos problemas e tornando-os menos sérios.
Quase nunca usava sua autoridade de mais forte e gostava de andar ao
redor toda tarde, prometendo aos macacos que eles seriam a sua
refeição do dia seguinte se nada melhor aparecesse, o que gerava uma algazarra
nas árvores enquanto ele dava boas risadas.
Apesar de amigo e companheiro havia algo que o impedia de ter mais
proximidade com outros animais. Ele ficava enraivecido sempre que alguém o
fitava. Poderia conversar longamente com todos, desde que ninguém olhasse
diretamente em seus olhos, pois ficaria por demais irado e, com um rugido, saía
mal-humorado. Mas todos, conhecendo esta particularidade, sabiam como tratá-lo
e até brincavam entre si dizendo que ele ficara assim desde que vira sua
própria face no espelho de água do rio Molan, e admirou-se de como era feio.
Era apenas uma versão
entre os macacos que se divertiam com esta história durante as noites.
Ninguém, nem mesmo ele, na verdade, sabia o porquê desta irritação ao ser
fitado. Conhecendo de antemão o seu temperamento, todos sabiam como tratá-lo e tudo
corria bem naquela parte da mata.
Mais distante próximo ao pântano da árvore alta vivia Píton, a
cobra. Dentre tantas outras cobras que
habitavam aquela área, Píton era a maior, mais forte e mais inteligente
dentre elas. Apesar de temida entre todos
os animais, Píton não era de tão difícil relacionamento como imaginavam.
Era séria, compenetrada e muito
desconfiada, sem dúvida. Mas também sempre se
mostrava bem disposta a ajudar em momentos de crise. ‘Quando houve a última
enchente’- reconhecem todos – ‘Píton foi a primeira a voluntariar-se
para ajudar os animais que não conseguiam nadar’. ‘Mas também fala disto até hoje!’-
completam os mais críticos. Apesar de não ter a sensatez do Leão e a
descontração do Leopardo, Píton era reconhecida como líder. ‘Um líder não deve
ser temido, ranzinza e desconfiado’- lembravam os macacos, mostrando que lhe
retirariam o cargo se pudessem. Era sabido que Píton, a
cobra, possuía um grande complexo de inferioridade pelo fato de se
postar sempre mais baixa que os outros animais,
por ter que rastejar. Muitos, assim, ignoravam a sua presença. Certa vez
um elefante quase a pisou por não vê-la, o que causou grande indignação. Desde
então ela detesta ser tocada e sempre lembra a todos o seu lema:
‘Nunca pise em mim!’
Certo dia surgiu um assunto de urgência que envolvia toda a floresta.
Algumas hienas, temidas por todos os animais de bem, decidiram mudar-se para
aquela região. Todos estavam reocupados
e criavam muitos boatos e rumores sobre isto. O Leão, prevendo um estado de
pânico, decidiu convocar uma reunião entre a liderança da floresta: ele, o
Leopardo e a Píton iriam se reunir junto à sua moita no dia seguinte.
No dia esperado, logo cedo, chegou o Leopardo e como de costume fazia
piadas do Leão chamando-o de “Jubinha”
referindo-se a um fato constrangedor e nunca mencionado pelos outros
animais: o Leão nascera com menos pelo em sua juba que outros da sua espécie.
Fingindo ignorar as piadinhas o Leão chamou-o para baixo da árvore e ofereceu-lhe
água do riacho que por ali passava. Logo em seguida, sutil e esguia, chegou
Píton causando surpresa no Leão. ‘Não pensei que viria tão cedo’ - comentou ele
referindo-se aos constantes atrasos de Píton nas últimas reuniões de liderança.
Como sempre Píton permanecia calada e procurou calmamente o lugar mais úmido
para se
enrolar.
Durante o dia o Leão, o Leopardo e Píton conversaram sobre todas as
implicações da vinda das hienas para a floresta e, após ouvir longamente as
inúmeras sugestões dos outros animais, estavam prestes a tomar uma decisão
quando foram interrompidos pela comida que chegava. ‘Pensei que era plano do
Leão trazer-nos aqui para matar-nos de fome’ - comentou o Leopardo entre risos.
Comeram regaladamente e após tudo ser devidamente
limpo decidiram descansar por um curto período antes de retomarem as
discussões.
Neste momento, enquanto Leão, Leopardo e Píton dormiam, surgiu
sorrateiramente um pequeno inseto típico daquela parte da floresta chamado
Kintano. É uma espécie de grilo com apenas 2 centímetros de tamanho e que costuma
fazer um buraquinho na areia onde esconde-se nos momentos mais quentes do dia.
Sem ser por ninguém percebido, Kintano pulou até o lugar onde o Leão deitava
sobre sua limpa e macia moita e começou a cavar o seu buraquinho com suas
patinhas traseiras, lançando a areia para trás à medida que desaparecia dentro
do seu abrigo.
Entretanto, com a força de suas patinhas, Kintano conseguiu arremessar
aquela fina areia até o focinho do Leão o
qual, cheirando a poeira, levantou-se de um salto julgando ser uma
brincadeira do Leopardo. Fitou-o bem nos olhos
e num rugido gritou: ‘por que me sujou? Você sabe como
detesto sujeira!!’
O Leopardo rosnou indignado: ‘Não sei do que está falando, mas você sabe
que odeio quando alguém me fita!’
Os dois começaram uma estrondosa luta quando, não percebendo a Píton, o
Leopardo a pisou com sua pata traseira fazendo-a acordar irada e gritando: ‘Não
admito ser pisada por ninguém!’
O Leopardo, mais jovem e forte, matou o Leão em uma tremenda batalha! A
Píton, sagaz, enlaçou o Leopardo e o apertou até que morresse; entretanto, com
tamanho esforço, não resistiu e também morreu. Houve silêncio em toda a
floresta.
Como líderes tão bondosos, gentis e responsáveis chegaram ao ponto de se
matar? - Perguntavam todos.
Os animais da floresta, atônitos, baixaram suas cabeças e
dispersaram-se. E o Kintano...
O Kintano, após tudo acabar, saiu do buraquinho na areia, olhou ao seu
redor e começou a pular em direção a outro vale, a procura de outros líderes em
outras florestas.
‘U Mallenyaan nyen Kintan so. U nyen kenin, sedimaten, tob anun ni
kagbaan pu na’.
‘O Diabo é como o Kintano. Ele veio apenas matar, roubar e destruir’ -
dizem os Konkombas.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe sua opinião sobre esta postagem.